Por Luis Filipe Melo
O movimento dos bombeiros que ganhou o apoio do povo do Rio de Janeiro tem vários vilões, a começar pelo governador Sérgio Cabral, que agindo como os ditadores, na certeza de que a mídia o protegeria, mandou tratar os bravos soldados do fogo como bandidos.
Mas ao fim de uma semana histórica não é apenas o governador Sérgio Cabral que está desmoralizado perante a esmagadora maioria da população. Outro personagem sai tão ou mais desmoralizado que o governador. Trata-se do comandante-geral da PM, coronel Mário Sérgio.
A história militar está cheia de exemplos gloriosos e vergonhosos, de comandantes que tiveram nas mãos o poder de decisão, e o usaram para o bem ou para o mal, e as conseqüências de suas escolhas mudaram o rumo dos acontecimentos.
O coronel Mário Sérgio teve nas mãos a oportunidade de ter saído consagrado como um herói e receber o respeito e a admiração de toda a tropa que comanda; a gratidão dos bombeiros; o reconhecimento da população. Bastava ter se recusado a cumprir a ordem absurda e inconseqüente de atacar os bombeiros, como se fossem bandidos. Mas faltou-lhe coragem.
É claro, sabemos que recebeu ordem de Cabral para empregar força máxima, para acabar com a ocupação imediatamente, a qualquer preço. Mas nessa hora poderia ter dito para Cabral: “Governador, eu não posso jogar a Polícia Militar contra os bombeiros. É preciso negociar.”. Mas não. Aceitou a ordem passivamente, preferiu preservar o cargo.
Na vida militar todos já devem ter ouvido a expressão: “Missão dada é missão cumprida”. Expressa a disciplina e a hierarquia. Mas o que aqueles que não são militares desconhecem é que também existe uma máxima nos quartéis, seja qual for a corporação militar: “Ordem absurda não é para ser cumprida”.
A mídia que no primeiro momento fez o jogo de Cabral e quis jogar a população contra os bombeiros, manipulou um fato importantíssimo ocorrido durante a ocupação. Foi o momento em que o coronel Mário Sérgio falou aos bombeiros dentro do Quartel Central. Todos viram na televisão um único trecho onde o comandante da PM aparece dizendo: “Peço aos senhores que vão para as suas casas...”. Mas não tiveram coragem de mostrar o início da fala, que, aliás, saiu nos jornais, lá no meio das matérias sem nenhum destaque, quando ele começou falando: “Não esperamos ter de agir de uma forma violenta” (vide reprodução de O Globo).
Que negociação é essa? Isso é diálogo? Uma fala que começa com uma ameaça do emprego de medidas violentas contra os bombeiros, num momento de tensão?
Mas agora prestem atenção para um detalhe importantíssimo que ninguém até hoje falou. O comandante da PM depois que saiu da reunião com Cabral e foi para o Quartel Central trocou a farda e colocou o uniforme preto do BOPE para falar com os bombeiros (vejam a foto acima). Isso é como se diz na linguagem popular “pintou-se para a guerra”. Por que motivo um comandante da PM troca a farda e coloca a do BOPE, se não for para passar um recado de que vai usar a força?
Na história, até na 2ª Guerra Mundial, entre as tropas nazistas, há exemplos de generais, alguns da confiança de Hitler, que na campanha militar da Rússia, quando sabiam que tinham perdido a batalha, se recusaram a cumprir a ordem insana de não recuar, porque sabiam que isso representava levar para a morte os seus comandados. Sabiam o que lhes esperava pela ousadia. Hitler mandou fuzilá-los, mas “não cumpriram a ordem absurda”. Morreram tendo o respeito dos soldados que comandaram.
O coronel Mário Sérgio preferiu manter o cargo e deu a ordem para o BOPE invadir. Não satisfeito, em mais uma ordem absurda para fazer média com o governador, tentou impedir a participação de policiais militares na manifestação histórica deste domingo. A reação da sociedade à ordem de obrigar todos os policiais militares, mesmo os de folga, a passarem o domingo no quartel foi tão grande, que 24h depois da ordem, deu a contra-ordem para não piorar a crise.
O coronel Mário Sérgio, pelo cargo que ocupa, recebe muitas medalhas, colares de mérito e outras condecorações. Pode colocá-las no peito ou numa moldura na parede. Mas pode passar o tempo que for que não será lembrado por nenhuma dessas homenagens. Escreveu seu nome na história da Polícia Militar, como o comandante que ordenou que policiais fossem usados contra bombeiros que apenas lutavam por condições dignas de trabalho. Para sempre será lembrado por escrever uma página vergonhosa na história da corporação bicentenária que é a Polícia Militar do Rio de Janeiro. Podia ter feito tudo de forma diferente e entrar para história de maneira mais digna, mas faltou-lhe coragem.
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