Bombeiros espionam Facebook e e-mails para prender militares que criticaram a corporação
Justiça Militar quer saber como mensagens privadas foram parar com a Corregedoria do Corpo de Bombeiros. Grupo de 19 enfermeiros passou quatro dias em detenção
Na última segunda-feira, um grupo de 20
bombeiros militares do Rio de Janeiro foi surpreendido com ordens de prisão.
Todos são enfermeiros da corporação, encarregados, por exemplo, de socorrer
vítimas de acidentes nas estradas. O erro que motivou a punição: todos debatiam,
pelo Facebook e por e-mail, questões consideradas internas dos quartéis. Os 20
passaram quatro dias detidos em vários batalhões e foram libertados na
quinta-feira, por força de uma liminar expedida pela Justiça Militar, assinada
pela juíza Ana Paula Monte Figueiredo Pena Barros, concedendo habeas corpus ao
grupo.
A decisão da juíza, em face do pedido do
advogado Carlos Azeredo, que representou um dos bombeiros, virou o feitiço
contra o feiticeiro. Para a magistrada, as provas apresentadas pela Corregedoria
do Corpo de Bombeiros para embasar as prisões foram colhidas de forma ilegal,
pois os e-mails, as páginas de Facebook e todas as mensagens trocadas pelo grupo
são privados, não passíveis de monitoração pela instituição militar. Diz a
juíza, em seu despacho: “O ilustríssimo corregedor interno da corporação
determina a instauração da sindicância para apurar conduta dos militares
envolvidos, visto que os mesmos postaram comentários inadequados em rede social,
bem como através de e-mail, tornando público comentários que concorrem para o
desprestígio da corporação’, tudo sem mencionar como foram obtidos tais
comentários e conteúdos de e-mails”.
A juíza ainda faz uma observação: “Ressalte-se,
o e-mail em tela não pertence à corporação, não se trata de e-mail funcional,
mas sim privado, pertencente ao Hotmail. Sequer no relatório da Sindicâncias
encontra-se demonstrado como foram acessados o grupo fechado no Facebook e os
e-mails (...)”.
A página em questão, denominada GSE CBMERJ -
sigla de Grupo de Salvamento e Emergência - Corpo de Bombeiros Militar do Estado
do Rio de Janeiro - foi criada com alguns cuidados. Entre eles o de deixar claro
que o objetivo da iniciativa não era o de comandar greves ou ‘amotinar’
militares – um zelo para evitar que a iniciativa fosse confundida com o
movimento grevista que resultou na prisão e na expulsão de bombeiros do Rio e da
Bahia, em 2011. Uma cópia desses e-mails foi anexada ao processo. Na mensagem do
dia 6 de setembro de 2012, a cabo Viviane Ferreira Carvalho, escrevendo para os
colegas, diz o seguinte: “Não estou aqui propondo uma revolução, uma
manifestação nem muito menos uma greve, odeio ser militar, mas somos, e tudo
podemos propor e resolver com o regulamento, com leis e com normas que estão à
disposição de todos”.
A bola, agora, está com a corregedoria. A juíza
afirma, ainda, que o corregedor “deverá explicitar, especificamente, o modo como
foram acessados o grupo fechado da rede social Facebook e a conta de e-mail
pertencente a Viviane Ferreira Carvalho”.
Em resposta à reportagem do site de VEJA, o
Corpo de Bombeiros Militar do Estado do Rio de Janeiro respondeu que as prisões
foram decididas pois "surgiram indícios do cometimento de condutas irregulares
por parte dos militares. Diante dos indícios, foi instaurado procedimento
apuratório em que ficou configurado o cometimento das seguintes transgressões
disciplinares: proferir ofensas contra o comandante de suas unidades através de
grupo de rede social virtual; e disparar correspondência eletrônica incitando
quebra na cadeia de comando e desrespeito do comando de suas unidades.
A corporação não explica como a corregedoria
teve acesso às mensagens pessoais e ao grupo fechado do Facebook. "Este
esclarecimento será feito à Auditoria de Justiça Militar do Rio de Janeiro",
limita-se a informar a assessoria dos bombeiros.
REVISTA VEJA
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